Ola!

"A felicidade não passa de um sonho, e a dor é real... Há oitenta anos que o sinto. Quanto a isso, não posso fazer outra coisa senão me resignar, e dizer que as moscas nasceram para serem comidas pelas aranhas e os homens para serem devorados pelo pesar."(Schopenhauer)

sexta-feira, 9 de novembro de 2012

Rua Solidão



Tenra idade, possivelmente não mais terei prazer em tão consolável época, doutra forma como poderei viver de um mundo donde castelos eram feitos de tinta, com pinceis à lápis e toda cera de cores aos quais o tempo não conserva. No mais, não haveriam laços de ignorância esnóbil, nem maculas vindouras de completa maturidade que trazem acerca da maioridade. Não me resigno ao simples que lamenta o passado, mas me sinto aturdido ao ver que o tempo não desmontou minhas memórias. Com certeza aos mais atentos destas linhas, viver-se-á nelas por instantes, mesmo que resolutos, mas claros instantes... Que imperfeito mundo fez de momento perene traço da simplicidade de uma criança.
Tenho todas as certezas do mundo quando me refiro ao aprender que um infante traz consigo, digo, que nascemos em maioria sós advindos de madre, aconchegados de zelo e cheios de amor, mas também o digo a tantos que vivem de solidão e apenas surgiram neste globo arremessados a própria sorte e duvida, aprendendo estes forçadamente aos ares, a terra, a cor do céu e o conceber das estrelas como único benfazejo amigo, e não poderia ser melhor instrutor a quem não tem os seus. E este menino pobre acorda todas as manhãs visionário, mas não o faz pensando no futuro de adulto que nunca quis ser, e sim como o de criança que sempre será no fundo do peito. Seria certo que ele cresceria e quem sabe seria doutor, cobrador de ônibus, lixeiro ou professor, bem, deixou-se imaginar ainda de sua vivencia de menino pra ser dentro de seu próprio mundo o que queria; tudo o que quisesse.
Os carros passam distantes, tanto quanto a mente daqueles que ali convinham, e tantas silhuetas por dentro dos vidros escuros, e tão poucos de coração compreendido que em vão têm; rude o dizem consigo: não o sei, nem lho conheço; menino sujo de poeira e suor, talvez menino de rua? Rua de menino? E não lhos notam o brincar singelo que pediria um abraço ou sorriso companheiro. E vi também que a miséria não convive só entre os pobres de dinheiro, e que existem tantos tipos de miséria.
Andarilho que se fez conceber nos mínimos oferecidos, caçador de si, teimou a ler de tudo que via, quando pouco arfava de pouco saber, ainda acredito ter ele maior companhia na curiosidade, talvez pousada das notícias de jornais, dos livros grossos sobrevindos, que tinham algo mais além das imagens. Montou as palavras como fazia no quebra-cabeça do lixão, queria entender a maldade do homem, e a morte da inocência, por que da dor? Por que tanta ciência se ainda outros como ele pereciam? O sacolejar na barriga do garoto previa a fome que o perseguia desde a noite anterior, doutra forma o menino sorria sozinho num repensar dos homens que ali teimavam rápidos e intrépidos, eram olhos de criança esperançosa que contrariavam desconfianças alheias, de pedinte que sempre fora naquelas manhãs, e as brincadeiras não poderiam superar a algo tão supramente necessário quanto à sobrevivência.
Todos os dias são necessários a quem vive, de refazer-se dos erros do mundo, fatos que ainda não nos demos conta e tanto pagamos por grande leviandade da carne, mas mesmo quem existe está atento as tantas vidas que nos cercam, no entanto fazemo-las não nossa, e quão grande fardo é ao ser ter de viver sem que sejamos nós mesmos, relembro no garoto que passeava as ruas daquela cidade e catava ao lixo seus brinquedos, seus livros e suas companhias, arquétipos de memórias; única sina, e pormenores que a sociedade esqueceu, e que na desilusão fez rapsódia diuturna, onde dormirás tão cabisbaixo anjo? Sua cama é do papelão escrito, enquanto o mundo é sobre ele bicho-papão, tentando massacrar suas visões; na cidade cresce o edifício e o homem definha, e quando realmente achará nele próprio o ser humano?
Talvez me interpelem: onde há prazer no auguro do abandono? Se não podemos culpar o mundo, nem pais, nem ele próprio pode explicar ainda infantil destino, quanto mais agora já adulto vos fala. Possivelmente algumas pessoas aprendem de maneira difícil, e outras muito menos passam por cima de tudo e de todos, e cegos e velhos não têm o que de bom relembrar em senil idade. se livraria o garoto de todas as amarras das maldades que atentam a juventude, de vícios, e de triste fim ao largo de sete palmos de terra? Não poderia ele se trancar naquele mundo sem refazer o próprio, adulto se faria bem antes do tempo, algum dia não haveriam mais migalhas, nem opróbrio escuro do noturno, mesmo as calçadas não o reconheceriam pisar descalço por agora, nunca mais teria companhia na fome, nem mesmo levantaria a mão de pedir, seria então testemunha viva, que ninguém a percebeu, quem entenderia senão unicamente quem o sofreu; de brinquedo aos pedaços, é de juntar forças e experiências necessárias a ser diminuto nesta selva de pedras e crer-se menor no mundo, que por pior que seja de alguns, reféns moramos todos nós.

(Cléber Seagal)

Um comentário:

  1. Salve meu querido!
    Tudo bem?
    Fique à vontade para levar minhas palavras onde você achar que deve. Às vezes nossas mãos não alcançam outros jardins!

    Bem vindo por lá pela Ilha. Volte sempre!
    Abraços!

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