20 de Outubro de 2011,
Hoje,
enquanto arrumava os livros e desempoeirava papéis mais antigos, encontrei
dentro de uma antiga agenda do colegial uma pagina de jornal na época ano 2000,
nem havia observado bem e a jogaria fora se não abrisse e me ligasse com o
passado. Quando notei vi a foto de uma antiga amiga; ex modelo, posando em
mise-en-scène, nuns gestos sensuais que desconhecia nela. Não maldei o ato,
quanto mais o fato, relembrei que o tempo muda a identidade de cada um por si,
reconheci que Mario de Andrade tinha razão quando falava “O poeta é o mundo trancado dentro de um homem”. Somos mesmo esse
ser mutante... Profícuo. Naquele momento vi que a poesia estava nos gestos,
como a amizade existe em não maldar no outro o que é uma égide de pureza.
Foi
preciso que eu retrocedesse num flashback do tudo, e como seria diferente não
fazê-lo a partir de boas lembranças, voltei aos tempos de escola. Era a
inocência misturada às revoltas com o mundo, das paixões incontestáveis, dos
zelos e absurdos que me foram base para ser o que sou. Notório mesmo foi me ver
em abraçares que creio não mais terei, sim, porque um abraço não é igual a
outro, como um beijo também não, até uma palavra na boca doutro toma proporções
diversas. Forcei-me ao ver nos dizeres alheios o requinte magico de um momento,
eu observava com atenção e cautela meus.
Sentei um dia na escadaria do colégio
que dava acesso a vista de todo o prédio com a piscina ao meio, eu disse e já havia
dito comigo mesmo; nada é para sempre... Mais ao fundo encostada encontrei essa
doce amiga da foto, ela lia uma carta, atenta nem notou que eu a olhava, e se
naquela época Almeida Garret existisse para mim, talvez eu não fosse tão
imediatista, talvez um pouco menos trivial eu entonaria Rosa sem espinhos, e inconscientemente eu findei por dar corda à
forca que se formara na vida dela. Ela me disse graciosamente que namorava, e
amava por ter recebido um elogio, foi chamada de “virtuosa”, eu não duvidaria,
o dono da carta tinha razão, tanto que ele a aprisionou para sempre longe de
qualquer amor, mas o desfecho só me veio dois anos depois, quando ainda saudoso
a vi numa parada de ônibus em pleno centro de Fortaleza. Reparei bem e apurei
se eu não me enganara, ela estava diferente por demais, mas era mesmo verdade
que a vi; os olhos sem vida, um rosto cansado, uma aparência descuidada, bem...
Ela não me reconheceu, tentei passagem pelas lembranças dela, por fim
sobreveio-a quem fui, mas agora não adiantava mais, tempo perdido; triste a
morte de uma ilusão, e aquele solilóquio do filme A Maquina do Tempo tomou-me: “Todos temos
máquinas do tempo, as
que nos levam ao passado são as lembranças e as que nos fazem seguir em frente
são os sonhos.”
Ironia a parte, aquilo para ela era um pesadelo. Ele
a maltratou tanto... vi nos seus pulsos também denegridas a imagem do belo, a
todo o momento eu sentia estar falando com outra pessoa, mais uma vez vi longe
quem eu conheci e sobrei do espaço que agora se encontrava seu coração; pôs-me
literalmente a chutes, era como tentar enfrentar uma correnteza. Minha amizade perdida
num vazio... Imaginei: Tem gente que morre em vida.
Provavelmente
ela se sentiu morta para o mundo, certamente a amizade que ela tinha por mim
faleceu há milênios, mas a imagem duma santa em vida existiu, essa marca que
alguém já representou para o outro, do que já foi puro e fecundo, visionário,
isso ninguém jamais tira. Incrível é saber que a eternidade prende-se na
importância do lembrar, minha amizade com ela durou o tempo necessário para me
ser feliz, cacoete de Lamartini: o homem
é um deus caído que tem saudades do céu.
Agora
eu segurava com cuidado o jornal, ele já não tinha tanta resistência, inútil
reticência minha quando o dobrei, minhas lagrimas molharam o que sobrou, agora
definitivamente “Memento”. Quando eu tinha 18 anos não me imaginava chorando
por alguém; vícios do passado, e agora são lagrimas de papel, entrego-o de
volta as minhas memorias da gaveta do relicário, ninguém precisa saber o que eu
precisei viver, só você. Cada um sabe as dores que carrega; Pedaços de amizade.
“Amor - coloquei meu coração na janela do meu quarto a fim de ressecar meus
sentimentos e o mundo triste que nos circunda, e pensei: tomara que ela esteja
bem”.
Um
amigo me gritou da janela, respondi que já ia, despertei de meu labirinto. Lembrei
que tudo que começa tem um fim, e sempre há um recomeço para todo final, bem, eu
já tenho maduros anos, vivi meus amigos, e estes viveram-me, Até hoje noto
minhas amizades, uns vêm e outros vão tomados pelas circunstâncias, pela
fragilidade. ah! O tempo, rudeza ou bondade da vida? Eu a dou meu melhor, como
ainda amo meus amigos. Há sempre novas auroras boreais; sempre sorrisos além dos
ecos do silencio que me aprazem, além da caneta que emendei aqui, seu olhar
nestas letras importa-me, mesmo a diferença que tu possa ser na vida de um
alguém, quem sabe esquece parte de teus gritos, dos teus ritos... Sonha amiga, pois
daqui te ouço bem, vês como pode ser única.
(Cléber
Seagal).
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