Ola!

"A felicidade não passa de um sonho, e a dor é real... Há oitenta anos que o sinto. Quanto a isso, não posso fazer outra coisa senão me resignar, e dizer que as moscas nasceram para serem comidas pelas aranhas e os homens para serem devorados pelo pesar."(Schopenhauer)

segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Casa de Taipa


Quando chega a noite não há muito por onde olhar, de um lado a alvenaria espessa dos arranha-céus e do outro a sobriedade desumana dos que vivem do poer, uns pedem, outros trabalham, e demais que se dão ao luxo de comemorar fazem da escuridão um leito de normoses, eu já passei por estas ruas, e apesar da diferença dos nomes são todas similares, na verdade deste mal sofrem-se todas as capitais, aglomerados urbanos, tentativa de sobreviver.
Um senhor já em senil idade acende um cigarro, e sentado no banco da praça admira dos feixes de luzes que correm as ruas, pois ao olhar para o céu não viu estrelas; margeado escuro desceu vista, apenas a constatação de mimicas de cadentes que dispunham em meio ao centro da cidade, umas azuis, outras amarelas e ainda brancas... Transitório este consenso entre natural e artificial, porque ao dia nem luzes vejo, só observo faces marginalizadas.
Já vai tarde prediz outro homem que para na noite, e o frio margeia de ventos todos os lugares, quem tem casa à procura, quem não tem ajeita-se na rua. Ainda que nos grandes centros seja cômodo dormir diante das vitrines, das lojas e das propagandas que fermentam a ilusão subalterna de pesares, os mais frágeis apenas olham o palpável. Uns adultos entendem que o sonhar é utopia, e as crianças o fazem de esperanças certas, ainda lembram-se das fadas e dos gênios da lâmpada, gnomos em veste característica... O pai não sabe o que dizer a uma criança que enseja tanto um brinquedo, para um adulto basta existir, mas nada basta a curiosidade da juventude, foge-lhe a ideia; sonhar é necessário. Por isso o senhor arrasta o pequeno, enquanto começa a neblina.  
Foram no ônibus e a pressa da chuva era inerente, não diferente dos demais que iam à condução, era excepcional preocupar-se de chegar em casa e buscar abrigo. Dos vidros já goticulados os menores tomavam tempo, a paisagem muda de prédios e mansões para casebres a parte, então a chuva chega para os da região norte. E já se chegando a outra parte da cidade se fazia lama no caminho para a casa de taipa, eram 22h00, a mãe dos meninos esperava solene e ansiosa, porque pelo contrario de alguns burgueses, políticos que fosse; pobre também tem família e ama, carece de viver.
As crianças correm na noite ainda que se molhando da chuva, abraçam a senhora que os traz a dentro, o senhor retribui o sentimento da mulher, depois disto ele olha uma vez o céu, depois olha para a casa, faz um pai nosso e adentra rápido com a parceira. O que se segue são trovoadas, o filho menor inicia o choro; estranho para o pequeno, enquanto o segundo apenas ajeita o canto da rede, o terceiro ajuda o pai e a mãe na coberta das biqueiras por dentro de casa; bacias e baldes não o faltam. No nordeste era difícil chover, pedia-se sempre que o inverno chegasse para apascentar a seca definitivamente severa. A capital não precisava de tanta agua, mas chovia, e aquela agua não tinha para onde escorrer, as construções também eram simples, igualmente aos moradores. E aquele inverno de 1990 foi um dos maiores.
Seguem-se as horas... Era então madrugada, ainda estava quente o colo da mãe, e no outro o pai ajeitava mais dois. As cobertas eram poucas às necessidades, ainda cabia ali um abraço cortes, um carinho. Enquanto o senhor cochilava com a família no quarto um estrondo, uma das crianças despertou aos prantos, entra-se o desespero, ao avaliar do barulho em meio ao da chuva a família repara que metade do casebre caíra, sobrou-se um quarto e a sala, a mãe dizia: - Meu Deus do céu, o homem resoluto apenas aparava as demais paredes verificando se não corriam risco a família, mas a agua não para de escorrer, a mulher ainda contava as crianças; estavam todas bem. Todos molham os pés, e a preocupação é de se atrepar todos os materiais, os meninos entendem a dimensão da desgraça, os dois mais velhos correm ao pai para ajuda-lo, enquanto o menor a mãe levanta.
Agora o homem duvidava de Deus, rogar a ele não adiantava, mesmo sendo a ultima coisa a que acreditavam, e não haveriam outros lugares à ir, nem durante a noite e nem depois, o que caberia a um pai de família fazer quanto a este infeliz destino, porquanto que dos homens já foram esquecidos, e agora o sentimento de esperança seria o único que lhe tomam, juntam dos escombros ate amanhecer, e as rezas já não bastam sem as ações. Os vizinhos durante a manhã percebem o mal e fazem-se de ajudas. É necessário ter forças, não desanimar, e daí até o pequeno já contribui, e a mãe não sabe o que fazer depois dos escombros. Difícil viver acerca da sobrevivência, enquanto a casa não mais tinha além de a metade e mesmo com fins da chuva as nuvens acobertavam-se de medo, e a família já não via com bons olhos o firmamento.
O senhor olhou ainda pelo espelho no chão, visto que a desgraça se abate forçosamente sobre quem menos tem condiçoes, e já não bastando as doenças, fome, solidão, egoísmo, abandono, hipocrisia, desrespeito, e desastres naturais, lembrou do simples fato de não ter nascido em condições favoráveis, mas que lembram resistência e colocam-no numa tragédia. Não viu necessariamente em Deus a culpa, se este existir, mas enquanto saía dos amontoados pisou uma flor ainda persistente; margarida. E também lembrou mudando o semblante; coexistência entre bondade e maldade, e definiu: a culpa é mesmo do ser humano.  

(Cléber Seagal)

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Alegando...


Afora todas as de amar dessabores
Ficaram meus dedos de dores
Cicatrizes das notas no violão tocadas
Rascunhos de choro que não logradas,

Era cedo para o cantor,
E meu orgulho desabrochar
Na realeza da palavra Amor
Flor é todo sentimento a tropeçar

Amo sozinho e as escassas,
E nem pássaros e nem grilos mudam meu missivo
Reles todas as palavras
Que socorrem a um depressivo

Imito o semblante de um urutau à cerca,
Paralisou meus pensamentos de abolinar
E a janela parece muito mais estreita
Isto só a quem quer tanto respirar.

Oh! pobre de mim que sou sofrido
Tao cruel predestinei lívido
E minha cama dorme noites sinuosas
Como os espaços que assentem a portas.

Ei criança, dorme bem como se assim fosse
Não te atentes a esse mote
Imaginas que o tempo conduz
A manha há que se produz.

(Cléber Seagal)

terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Desgosto


O medo da solidão eu sei vem me tocar
A porta está trancada
A palavra foi mencionada
Nada mais há de me restar,

Corro pelos cantos aos prantos
Mas a alma vã a desmontar
E esse sorriso intrépido, outrora certo
Agora só a tristeza a me torturar,

O sozinho é tímido e moroso
Noutra parte da rua receio o desgosto
Avista ao longe o que mora
Embora o hoje se demora no fundo do meu coração.

(Cléber Seagal)

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

A Noite do Angustiado

Não sei o que faço, já passaram por mim vários destes senhores que vigiam da noite,
Dos limpadores que acordam, porquanto a cidade deita, e ajeita mais um dia de faina,
Segue-me suburbano um cão, e este é meu companheiro de angustias,
Enquanto a felicidade não me sorrir, e nem o céu pôde me abrir,

Não me bastando a treva, seguem-se as lagrimas,
Ainda que ultimas falhas, de andar a rua a meio e todo o desterro de almas que alariam
Tomam-me a arrepios, e o pingo de gota que desce da calha, clama o que dissolve,
Inunda toda a calçada, e a praça toma-se de gralhas que assombram,

E não é mais a penumbra que come, nem a solidão que descolore,
É o peso desconcerto desta madrugada insone, é meu pisar que dorme,
Enquanto todo o resto caminha, não há um ser vivente que teime da noite,
Tudo são labirintos, e a demora faz-me irromper do relógio, do monologo meu,

Aresta fria que assume quem sou eu, e saltimbanco de arrimo desmontou o tempo,
Minha piada feita de brinquedos põe-me a prova nas muralhas e cinzeiros,
São vícios, pronto estreito, e a fumaça se esvai nas passadas do homem que ainda fala,
E da boca de um senhor que já foi escrachada, ideia saboreada na palavra de um bêbado.

Corre noite, corre o luzeiro, e aqueles que dormem combalidos não sabem da metade,
Da tristeza que invade as almas de um trigueiro, e mesmo sabendo que me sejam,
Não o provam além do desejo, e minha alma corta a luz da lua, meu mundo estreito,
Eis-me noite, para outros talvez firula, Soa quase um cume de afago desespero,

(Cléber Seagal)

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Peleja no Sertão


Os pássaros enegrecidos voam
De angustiados povoam
Imemoráveis dos atos
Listo de quem vê fatos,

Os anus pulavam a larga
Em plantas de verde acácia
Abrem o céu límpido formoso
Que desce ao ar cabuloso,

Tomam-me e desfazem plagas
Destas denegridas falhas
Diferentes ideias afrontam
Enquanto de revoar destoam,

Gotas tempestivas iniciam
E as vistas dos seres propiciam
Toda fragilidade que cai d’água
Que assente triste na magoa,

Ouço ao inverno na escuridão
As crianças correm na aluvião
E dos mais velhos se entendem
A maturidade ressecada os comem,

O riacho estende-se muito
Não são mais lamas cuido
Tremem os galhos na alvorada
E toda forma de vida jaz morada,

Tantas esperanças se pediu
De um inverno que assumiu
A finda dor dos tempos demorado
Anseios do relógio dependurado,

Haja vista o horizonte
Vendo ainda o sol a fronte
Chuvas caídas se vão
Com o astro entre sim e não.

(Cléber Seagal)

terça-feira, 11 de outubro de 2011

O Viajante


Rememorável desejo, minhas mãos escorregaram das dela, baixei a vista e já sem prumo aprontei-me, e de certa toda a falta que um ser traz, embala todas as desilusões que alguém guarda. Meu veiculo dobra a esquina e já vai longe... Perdi meu coração.

Bateu-me um aperto ao peito, eu nunca senti semelhante angustia, agora terei tempo para chorar o que não mais tenho, sentirei o que é ser só; senhor sozinho. Muito intimo esse penar, acostuma-se com o calor doutro corpo, uma andorinha passeia com outra no final da tarde; tudo são amores, linda a felicidade dos outros.

Viajo na boleia, observo inerte o escurecer silencioso do espaço que me cobre, o frio substitui o calor, agora é dor verdadeiramente sentida de saudade. Não adianta que eu olhe para traz, ela se foi do retrovisor. Eu deveria abraça-la um pouco mais, senti-la demais... Estar com ela na cabeça não me basta.

As estrelas parecem distantes, perdidas por instantes como na madrugada o meu olhar. E no fundo mais escuro além do brilho de tilintar dos astros eu vejo a imensidão do mistério, uma dúvida semelhante se faz igual no coração dos homens, o que temos? O silencio das horas amarga-me.


Sinto cheiro de mato, e a relva distrai-me inutilmente... Já me foi cama, assoalho de prazeres e amores, fui dela toda a parte, e só a lua, esta lua que ainda sobra ao céu alumiou meus abraçares. Eu não precisava de lençol, meu cobertor era feito de amores de amada.

Toquei a vidraça da janela, doutro lado escorria agua... Catei o que não podia. O sereno vira chuva, e chove aqui dentro de mim também... Nas imagens do que não posso... Molho minha alma. Deveras cortante o que tenho, escrevo a mil, não sei se volto, não sei se vivo bem longe do que amo.

Quantas lágrimas caíram ao alvorecer do outro dia, nunca a chuva lá fora cobrirá minha tempestade por dentro. Nunca serei eu mesmo como dantes, foi à ingenuidade o poder e o negar transbordante dum adeus, sentirei que paguei pena por amar, por desejar e não mais terei.

O dia traz a luz do sorver, que emprega a sorte de tudo àquilo que renasce, doí-me em vista já tarde, mas meu frio não passa, nem sei mais o que fazer, primeira noite sem, primeira de varias... Só sabe destas migalhas quem me vê; sente este apertar... Não, amar também dói e minha dor é crônica.

(Cléber Seagal)